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quinta-feira, outubro 20, 2011

Alentejo: O trabalhador rural. Estes sim, trabalhavam no duro....e a recompensa são 100 e tal euros de reforma...

O trabalhador rural

Este homem aos 6 anos de idade, começava a endurecer os ossos por entre os brejos, embrenhados com o gado e perdendo o medo, porque era com esta idade o começo duma vida dura. Como não havia outra alternativa, seria atrás do gado a escola de quase todo o gaiato alentejano, de há 70 e 80 anos atrás.
Quer de Verão ou de Inverno, depois de percorrer todo o dia vales e outeiros, sabe-se lá com que sacrifício, chegava à malhada.
Aí não encontrava os braços abertos da mãe nem sentia o calor dos seus beijos, nem outras crianças para brincar, mas o desconforto triste de uma choça e muitas das vezes o maioral ralhando com ele.
Nas noites de Domingo, o maioral vinha a casa buscar o seu aviado (farnel) para toda a semana, e para estar com a mulher uma noite. Enquanto ele, ficava só. À noite na malhada longe do mundo que, por birra do destino, tinha que aceitar estar num ermo em algum lugar, somente com o gado e o cão. Ele também tinha uma noite no meio de semana PARA VIR A CASA AO AVIADO, e para isso servia-se da burra do maioral.
Mas ao nascer do sol já tinha que estar na malhada, para saírem com o gado.
Esta sua vida continuava assim ate à idade dos 12 a 15 anos, que era a idade de tornar a casa para aprender os serviços do campo.
Eram estes alguns do trabalhos que os rapazes novos começavam na vida do campo quando saíam de ajudas do gado podiam enrelheirar
Cortar arame nas máquinas debulhadoras, dar molhos aos carros, ripar azeitona e apanhar, apanhar mato no meio da terra lavrada para ser queimado, mondar no meio das mulheres.
Duma maneira geral aprendiam quase todos os serviços do campo. E assim continuavam pela vida fora debaixo da canga.
Por mais económicos que eles fossem, estavam a dever no comércio, na padaria, no sapateiro, no alfaiate e no ferreiro.
Os antigos tinham uma vida difícil, como eles mesmos dizem, só sentiram melhoria, quando lhes foram distribuídas as sortes (parcela de terreno). Nesta época fizeram muito geito ao pessoal que não tinha onde semear umas batatas nem ter umas couves. Embora já tivesse uma pequena aragem (melhorando a vida), as botas com trombas e o fato com chapadas, continuavam como até aqui. Só há poucos anos se deixou de ver no Alentejo este sinal de miséria.
Nesta vida pobre que se vivia, os trabalhadores mais novos em noites de luar depois de um dia de trabalho em casa do patrão, ainda iam cavar para as hortas de algumas pessoas que já não podiam. Também muitas das vezes cavava o seu bocado de terra para não perder nenhum dia.
Voltando ao fato roto com remendos, lembro que escondia lá dentro um homem elegante quando se vestia com o seu fato domingueiro, assim preparado com este conjunto de peças de vestuário, chapéu preto, camisinha branca, colete e jaqueta algodoados, calça à boca de sino, uma cinta e botas pretas.
Quanto ao conteúdo dos bolsos, lá estava a navalha, o velho lenço muitas vezes feito dum pedaço de lençol gasto e com bainha feita à mão, por não terem maquina de costura, uma carteira para guardar uns míseros tostões que mal davam para beber uns copos com os amigos. Se fumava, lá estava a onça de tabaco “Duque” sempre no bolso certo com o livro de papel “Laport”, e o isqueiro de isca espanhola, que so o tirava do bolso para acender o cigarro, depois de olhar para os lados, não fosse o diabo tece-las, porque outros já tinham sido multados.
Relógio não o tinha, era peça rara. O que tinha para se orientar para cumprir as suas obrigações, era a luz do dia, o sol, as estrelas e o luar. Depois começaram aparecer os relógios de sol, mas só quem os usava eram os capatazes emprestados pelos patrões.
E foi assim que o homem do campo, a desbravar terreno, chegou ao que é hoje, velho mas lúcido, e que não se furta às perguntas, pois sempre encontrei pessoas destas que gostam de me contar a sua vida

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